Trazer informação mais direta, clara e transparente para esclarecer a população sobre diversos termos que entraram nos debates sobre a crise climática é o objetivo do Glossário Ilustrado de Justiça Climática.
A publicação – elaborada em parceria por diversos movimentos ambientais – reúne 43 expressões ilustradas em versão trilíngue (português, espanhol e inglês), que abordam termos como Net Zero, descarbonização, maquiagem verde e siglas como BECCS e REDD, além de conceitos sobre agroecologia, desperdício zero, refugiados ambientais e racismo ambiental.
O glossário é uma parceria do projeto ArvoreAgua com a Plataforma Latinoamericana de Justiça Climática e a campanha Que Os Grandes Poluidores Paguem. As ilustrações do glossário começaram a ser produzidas no ano passado.
Na avaliação dos movimentos, a utilização de uma linguagem técnica especializada em fóruns internacionais sobre negociações climáticas “esconde a realidade”, e dificulta ou confunde o real entendimento de pessoas leigas no assunto.
Outro ponto destacado é que o uso cada vez maior desse tipo de linguagem acaba por tirar o protagonismo e limitar a participação de povos indígenas, comunidades tradicionais protetoras da floresta e de integrantes de movimentos sociais que atuam no combate à crise climática sobre os problemas e soluções da Amazônia a partir da própria sociedade civil de base.
O documento será lançado na quinta-feira (29), em Santarém, no IV Cinturão Cultural do Tapajós – Territórios e Resistência, encontro de lideranças indígenas e movimentos amazônicos, juristas de povos atingidos por grandes projetos de exploração mineral na América Latina, pesquisadores, jornalistas, artistas, produtores de alimentos e bioprodutos medicinais da floresta.
No lançamento do evento – organizado pelo Instituto Sebastião Tapajós com o Ministério Público do Pará, em parceria com o projeto Luz e Ação da Amazônia, da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), Coletivo de Mulheres Indígenas As Karuana e Instituto Cabana Tapajós – 100 livros serão distribuídos. Além da versão digital a ser disponibilizada em julho, a intenção é produzir mais exemplares a serem distribuídos gratuitamente.
Vocabulário técnico
Uma das parceiras do glossário, a jornalista e estudante de Engenharia da Ufopa, Patrícia Kalil, disse que os povos da floresta precisam se apropriar de vocabulário técnico usado nesses grandes encontros, como a 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30) na Amazônia, para não serem enganados e garantir espaço de participação e direito a voz, pois está havendo uma captura corporativa desses espaços de tomadas de decisão. A COP30 está marcada para novembro de 2025, em Belém.
“Trabalhamos para esclarecer toda essa terminologia técnica e superespecializada usada em mesas de negociações internacionais, COPs e relatórios corporativos. Como vamos discutir sem entender? Como vamos questionar os planos Net Zero sem entender que é uma trapaça maquiada de verde? Se o compromisso é de redução de emissões, queremos reduções reais, nada de compensações mentirosas e que não englobam toda a cadeia de produção e consumo”, afirmou a jornalista à Agência Brasil.
O glossário também destaca que, atualmente, as negociações climáticas têm se centrado mais em reduzir o problema das emissões do que em questionar sua causa, centrada no modelo de desenvolvimento calcado no uso de combustíveis fósseis, no extrativismo predatório e na desigualdade.
O documento diz, ainda, que muitas vezes essa linguagem facilita os grandes poluidores que não assumem suas responsabilidades e até geram falsas soluções para uma questão extremamente complexa. “Precisamos entender como os grandes poluidores manipulam as notícias, fazem lobby e infiltram seus interesses no governo, em organismos internacionais e na academia”, sintetizou Patrícia.
Segundo as organizações, esse jargão esconde a dimensão da crise climática e apresenta “falsas soluções” para o problema. Um dos termos apresentados no glossário para justificar o posicionamento é o de “neutralidade de carbono” cujo uso tem sido cada vez mais frequente nos debates ambientais.